O improvável se faz presente na animação “Mary e Max – Uma amizade diferente” pela distância de sua idéia nos dias atuais, porém, não muito diferente da lógica a qual estamos envolvidos quando trata-se de meios de comunicação. Se hoje, a proximidade, embora individualizada, se manifeste através da internet, em um tempo nada remoto – ainda existente em contextos especiais – eram cartas que mantinham relações e é em cima delas que a animação em stop motion do Australiano Adam Elliot irá se modelar.
Max sozinho na cinzenta Nova York |
Dois são os personagens que moverão o filme: primeiro a pequena Mary Daisy Dinkle, australiana solitária, que carrega uma mancha de nascença e é apaixonada por chocolate. Passando a maior parte do tempo brincando sozinha, observa a ausência do pai num trabalho enfadonho e suas manias pessoais (como embalsamar pássaros mortos); e sua mãe, uma alcoólatra cuja vaidade esconde sua adicção e os constantes furtos, compreendidos pela garota como empréstimos. Em outra ordem, no ocidente, na cinzenta Nova York, um homem melancólico morando num apartamento escuro acompanhado de animais. Frequentador de um grupo terapêutico, metódico, convive com a síndrome de Asperger e de outros transtornos obsessivos. Esse é o quarentão Max Jerry Horovitz vivendo numa singularidade sofrida e amargurada.
Mary é amante de chocolate |
O interação improvável desses dois só acontece quando, no correio, aleatoriamente Mary escolhe um nome numa lista e grava o endereço desejando mandar uma carta a um desconhecido com questões infantis e fantásticas como: “como nascem às crianças nos Estados Unidos?”. Munido de um climão perpassando o bizarro, através de estilizações de personagens de massa, o filme incita uma tristeza incomum em animações, despertando questões filosóficas e religiosas de forma nada sutil, utilizando de um humor negro brando em suas entrelinhas. A graça do projeto se dá nessa diferenciação, em sua originalidade e criatividade, colocando em jogo um caráter racional, embora brinque com fantasia. Essa valiosa, estranha e perpétua amizade ganha um sentido fascinante.
Genial em seu desempenho e desenvolvimento, o roteiro não se preocupa em dar soluções às angústias pessoais de seus profundos personagens, amontoando questões ao longo dos anos durante a troca epistolar que atravessa continentes, levando dias, restando a expectativa da demora enquanto a vida de ambos passa. Os dois contextos são explorados com intensidade mórbida, ao mesmo tempo que brinca com dilemas da vida, característica de seu diretor (vencedor do Oscar pelo curta “Harvie Krumpet”). Recheado de significados, “Mary e Max” detém um universo alternativo dentro das animações que implica numa dimensão inovadora, imaginativa e intensa no limite o qual poucos filmes do gênero conseguem nos proporcionar.
Poucas vezes assisti uma animação tão triste, vale a pensa conferir.
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