quinta-feira, 11 de setembro de 2014

Proseando sobre... Hércules

Uma das coisas mais estimulantes quando se pensa no conceito de expectativa é a possibilidade de se surpreender, ainda mais quando essa origina-se de uma expectativa negativa sobre algo. Muitos filmes decepcionam quando esperamos demasiado por eles. Outros melhoram. Filmes que, por uma simples espreitada no trailer já são considerados potenciais fiascos. Quando vistos percebemos que não são bem assim. É o que aconteceu com esse Hércules, nova adaptação dirigida por Brett Ratner e estrelada pelo sempre carismático Dwayne Johnson. Diante a possibilidade de assistirmos uma verdadeira catástrofe cinematográfica tempos após termos visto seu trailer fanfarrão, eis a surpresa em perceber que a obra não é essa atrocidade toda. Hércules (2014) é apenas irrelevante. E durante sua existência passageira nas telonas, consegue divertir muito sem comprometer a história original. Aqui Hércules é outro, é baseado em uma história alternativa. É um legítimo mercenário. 

O filho de Zeus, detentor de uma força imensurável, ganhou novamente as telonas. É natural que um personagem tão importante apareça mais frequentemente em épocas de tantas adaptações. Em seu início conhecemos aspectos de sua história. Os seus 12 trabalhos nos são apresentados brevemente através de uma narração que exprime a maior virtude do roteiro: questionar fatos e papeis. Os deuses parecem vencidos nessa obra, existindo como citações enquanto a epopeia de Hércules transcorre no cenário bem desenhado com tonalidades amareladas. Redescobrir seu valor enquanto um semideus desconsiderando intervenções divinas parece ser seu desafio. Vem corroborar a máxima: duas mãos trabalhando fazem mais que milhares rezando! 

É bem por aí. E olha só, Hércules não trabalha sozinho. Vem auxiliado por uma série de seguidores, alguns poucos soldados que ele colheu durante seus feitos. Insere-se aí estereótipos e uma arqueira feérica. Com o time, o semideus passa a servir o rei da Trácia (John Hurt) que prometeu como recompensa seu peso em ouro. O roteiro se agarra a esse serviço, levantando seus fundamentos a partir de uma liderança questionável, sem nunca revelar verdadeiramente ao espectador quais as intenções por trás de cada um daqueles rostos cansados de guerra e em constante busca por riqueza. Há uma série de flashbacks – por vezes insuportáveis – que deixam no ar uma dúvida sobre o passado do filho de Zeus. A ação retratada vem quase sempre acompanhada por muito humor, o que condensa a trama tornando-a um entretenimento divertido, um pipocão carente de substância suficiente para honrar dignamente a representação do mito de seu herói. 

Alan Moore fez campanha para o filme ser boicotado, pois lembrou de seu amigo ignorado, Steve Moore, morto em março desse ano, autor da HQ Hercules: The Thracian Wars, a qual este filme foi baseado. O cara mal foi consultado e antes de morrer demonstrou todo seu descontentamento com o que sua obra estava se transformando. É fácil entender tal queixa através do viés da narrativa filmada calorosamente por Brett Ratner. O diretor tem experiência em equilibrar ação e humor, vide a franquia A Hora do Rush. Formulaica tal como a maioria absoluta das grandes produções, Hércules é enérgico, engraçado, descerebrado e tem um grande nome envolvido como isca. O personagem está definitivamente mais humanizado, ainda que se eleve enquanto um ser sobre-humano beneficiando o deleite de seus fieis apreciadores. É para se ver, se divertir e naturalmente esquecer. Ahhh, Dwayne Johnson, que já foi o Escorpião Rei, funciona bem como Hércules apesar de suas expressões afetadas. 

Esse ano ainda foi lançado um outro filme baseado no personagem, Hércules (Legend of Hercules, The, 2014), dirigido por Renny Harlin e estrelado por Kellan Lutz. Não vi. Ninguém que conheço gostou. 


Proseando sobre... Os Mercenários 3

Com Os Mercenários, Stallone propôs reunir vários astros dos filmes de ação, a maioria oriunda da década de 80 e 90, e criar uma franquia que os eternizasse, trazendo ainda alguns nomes da nova geração. No segundo, a brincadeira residia na decorrência do tempo que resultou dificuldades físicas aos heróis, ainda que não impedisse atos heróicos de caras que não aceitaram o natural envelhecimento. Aqui nesse terceiro parece encontrar um equilíbrio entre gerações, considerando-as igualmente importantes, o que fundamenta a perspectiva do futuro dos velhos e novos mercenários. Têm-se o filme menos badalado da trilogia, o menos empolgante, no entanto ainda atrativo simplesmente pelas grandes personalidades em cena que dificilmente se encontrarão dentro das telonas novamente. 

Vemos muita energia acumulada, a virilidade enternece a trama modelando a ação com a viral comédia. O filme revela-se afetado por tanto humor. Formulaico, tem uma cena inicial colossal como um cartão de visitas do que virá em sequência. E essa ação convulsiva consegue despertar um comportamento comum entre os espectadores: bocejos. Este cinema definitivamente perdeu a graça. A trama que poderia inflar o nosso interesse desgastado não convence, se arrasta dentro do clichê mais odiável: o maniqueísmo tradicional proposto unicamente como válvula de escape de um roteiro ineficaz. 

Há uma cena de reunião, de diversão, celebração de um fim. Ela faz todo o sentido, pois abriga os semelhantes deste contexto maluco elaborado e que funcionou brilhantemente pela sensação de nostalgia proporcionada. Essa cena, realizada num bar, acaba sendo a melhor de todo o filme, já que ampara o valor da fita: a memória do pretérito de pessoas que tiveram absoluta relevância para a constituição de um gênero. 

Barney Ross (Sylvester Stallone) tem um novo e poderoso adversário, Conrad Stonebanks (Mel Gibson). Para poupar possíveis danos a sua velha equipe devido a uma falha ressentida durante uma missão infeliz, decide convocar uma legião de jovens para enfrentar o oponente. Inevitavelmente isso causa chateação nos velhos parceiros. Um transtorno visível nos olhares tristonhos daqueles homens cujo talento em expressar emoções se equipara a de manequins. Aí vira um filme de médias e discussões a respeito de valores, coragem e parceiragem. Por conveniência, Os Mercenários 3, filme dirigido pelo desconhecido Patrick Hughes, traz toda a truculência e as piruetas enérgicas esperadas de um filme desse gênero, especialmente envolvendo tantos astros. Termina divertido. Termina sem querer terminar.