sexta-feira, 30 de agosto de 2013

Proseando sobre... Além da Estrada

Passado nas estradas uruguaias, Além da Estrada (Por El Camino, 2010) é um road-movie que transita entre diferentes polos culturais, abrangendo uma camada da sociedade que se mantém enraizada em terras particulares, nos pampas ainda não desbravados pelo avanço da civilização e consequentemente da tecnologia. Vários são os personagens instalados em diferentes locais, vivenciando o cotidiano imutável, distanciados do progresso por opção, pelo sabor bucólico, pelo prazer de pisar na terra fértil. Nesse aspecto posto na tela pelo diretor brasileiro Charly Braun, estreante em longas metragens, ficção e realidade se fundem, com a linha divisora destes sendo quase imperceptível pela lógica de seu fundamento: demonstrar deslocamentos de corpos e sua fugaz existência diante belezas não reparadas. 

Concisamente, trata-se de um filme de relações, tanto com pessoas quanto por objetos, englobam-se também lembranças. O roteiro parece não seguir uma linha e tal como seus personagens, permite-se desviar o foco e encontrar o inesperado, tirando algo desse oculto encontro imprevisto. Acompanhamos Santiago e Juliette (Esteban Feune de Colombi e Jill Mulleady atuam com carisma e suavidade). Ele, argentino, segue até o Uruguai para tomar posse de um terreno que era de seus pais mortos num acidente; ela, belga, saiu da Europa para fugir de um sistema que não concordava, almejando uma liberdade disposta em outro sistema que ela entende como oferta de liberdade, de alcance de algo que anteriormente lhe era privado.

A câmera diz, ilustra e representa, pensando no seu foco no horizonte longínquo, como progresso inevitável ainda distante, enquanto laços se fazem e passados são recordados em diálogos breves do que se fez ou deixou-se de fazer. Nessa perspectiva, há muito de seu realizador, quase que uma declaração de sua íntima vivência, seu local no mundo e com quem o divide. É fácil se interessar pela narrativa, pois ela diz sobre nós, reflete a respeito de nosso transitar cotidiano floreado por encontros imprevistos e mudanças pessoais, adaptações precisas e sacrifícios em nome do dever e do outro. Nos créditos finais, imagens de arquivos elucidam tal impressão. Da mesma maneira que a imagem da câmera guarda, a memória armazena. Em algum momento vem à tona como insight. 

Buscando o ideal do real contrapondo a ficção de seus personagens centrais, assistimos coadjuvantes vivenciando suas vidas, são pessoas inseridas naquele contexto que mais do que fazer parte como um plano de fundo de uma história sobre “raiz”, dialogam com os atores e se tornam personagens. Esse pertencimento entra em sintonia com Santiago e Juliette que estão numa terra que não lhes pertence, reconhecendo similaridades através de buscas por razões que não nos são claras, porém significam algo ao constatarmos a falta que ambos sentem de coisas palpáveis. Charly Braun é inteligente ao enfocar tal saudade, trabalhando com delicadeza e brandura, filmando as relações se estreitando com a fotografia abrilhantando o Uruguai, seus campos e praias desertas, tão exuberantes que quase nos convida a encontrá-las. Torna-se um filme sensorial onde a terra exibida é uma importante personagem.

Não é um filme de amor em que um casal se encontra e subitamente se apaixona, acompanhamos uma história de compreensão de necessidades, compartilhamentos de ausências e a inevitável relação tangida pela insuficiência da vida. Apesar de alguns diálogos sugerirem que o longa está se transformando num love story casual, o que poderia desagradar o espectador interessado na abrangência de seu tema, percebe-se a mão do diretor freando o romance, fazendo deste algo simplesmente ocasional. Santiago até se encontra no meio do Uruguai quando depara-se com rostos conhecidos, figuras presentes em algum momento de sua história particular, estabelecendo um norte. Em via diferente, Juliette permanece desorientada, procurando aproximar-se de um romance antigo, motivo pelo qual chegou até o país.

Somos passageiros da viagem de Charly Braun pelas estradas uruguaias com sua beleza natural. Consentimos as relações estabelecidas, não só com pessoas, mas também com animais – em determinado instante Santiago revela seu carinho por cavalos. Num outro interessante ato, observamos uma fazenda onde um homem mora sozinho junto com 16 cães que o ajudam a cuidar de suas criações. Este nada quer além do que cultiva. Tal como ele, outros aparecem com suas produções, alguns artistas, outros fazendeiros, alimentando-se de pequenos prazeres encontrados no decorrer dos dias, como completude do vazio existencial. Um instante de contemplação, é o que o filme oferece. Seu ato final, belamente realizado, exibe uma ponte não concluída. Santiago e Juliette chegam ao fim dela. O amanhã.


quarta-feira, 7 de agosto de 2013

Proseando sobre... RED 2 - Aposentados e Ainda Mais Perigosos



Sucesso de público e relativo prestígio de crítica fizeram com que “RED – Aposentados e Perigosos” garantisse uma continuação com o mesmo bom e estelar elenco. Acrescentaram “ainda mais perigosos” no título nacional e pronto, nova aventura a vista, dessa vez com os problemas indo procurar os ex agentes ainda em plena atividade. É um legítimo caça níquel, conforme dizem alguns críticos. O protagonismo ronda Bruce Willis e John Malkovich, este segundo segue espetacular. Já a história é agitada e temperada com frases de efeito, tiradas cômicas e gags funcionais, especialmente com Marvin (Malkovich) e Sarah, esposa de Frank (Willis), vivida pela competente Mary-Louise Parker.

Com a vida tranqüila de um aposentado, Frank segue distante do que fora em seu perigoso ofício, pretendendo dar a esposa toda segurança que outrora lhe impedia. Ele mostra-se dedicado e preocupado com a relação conjugal, temendo que qualquer evento diferente possa fazê-la desandar. Desculpinha inicial, tentativa de fazer o herói ponderar fatos, revela-lo preocupado. Não demora para ele embarcar na onda e esquecer que hesitou. E ele vai ao lado de Marvin, Sarah e Victoria (Helen Mirren). A direção ficou por conta de Dean Parisot (As Loucuras de Dick e Jane) que se encarregou de fazer uma mescla de filme de ação com comédia, sendo feliz em alguns momentos em ambas as investidas.

Nada chama mais atenção do filme senão o elenco primoroso disposto no cartaz igualmente ao filme anterior, mas nesse contamos com o acréscimo de Anthony Hopkins, Catherine Zeta-Jones e o sul coreano bom de briga Byung-hun Lee, o Storm Shadow de “G.I. Joe”. Quem arriscaria ir conferi-lo pela temática? Alguns curiosos, certamente, mas não há motivação maior que Willis e Malkovich brincando com personagens que referenciam suas idades. Sessão de recreação. Outro atrativo diz respeito ao vários locais em que a equipe passa com destaque para Paris e Moscou. Várias cidades do mundo são palco para a ação dos aposentados, constantemente ameaçados por um esquema catastrófico nuclear, cujas proporções varreriam cidades do mapa.

O desenrolar de toda história, notoriamente esquemática e carente de solidez, fica por conta dos personagens que se viram sem grande profundidade – até por se tratar de uma sequência – viabilizando interação com o público, alvo para seus objetivos. Entendemos o que rola, nada nos obriga a refletir, o roteiro ainda prepara uma reviravolta como se essa fosse uma virtude.  De qualidade questionável, o longa parece entender que não passa de uma continuação com potencial de render alguma bonificação financeira aos produtores, tal como ocorreu surpreendentemente no original. Vale como diversão descompromissada, simplória, porém honesta, não querendo dobrar a mente do espectador com pretensões megalomaníacas.