sábado, 23 de outubro de 2010

Proseando sobre... A Onda


 O poder por si próprio, princípio da autocracia, regime pelo qual um único homem detém o comando completo de um grupo. A autocracia é o plano de fundo de “A Onda”, novo filme alemão com temática escolar num país que conviveu há algumas décadas com o nazismo. A questão que se coloca é: será que a Alemanha poderia reviver essa política em dias atuais? Em sala de aula, alunos divergem e discutem essa possibilidade, especulando sobre o novo contexto mundial. Por fora, corre ainda outra indagação: pelo que os jovens hoje lutam? A falta de referências e de ideologias é mostrada levando a busca desenfreada por questões urgenciais, por prazer, recaindo em bebedeira entre outras drogas.

Rainer Wegner (à dir.) é o idealizador
O professor de ensino médio Rainer Wegner – cheio de personalidade, com música alta e camiseta do Ramones – está a caminho da escola pretendendo dar aula de anarquismo. Frustrado quando recebe a notícia de que outro professor assumiu a matéria, se vê obrigado a se contentar com a disciplina de autocracia e decide levar o tema a contragosto para a sala de aula. Não demora muito para perceber o desinteresse de seus alunos. O professor decide inovar: leva a questão para a prática e incita uma formação de um grupo como exemplo do que seria esse modelo de governo. Eles criam um nome, “Die Welle” – traduzido como “A Onda” – denominam um líder, constituem um ideal, bolam um símbolo, se uniformizam e estabelecem uma saudação.

"A Onda" se dissipa
O filme, dirigido por Dennis Gansel, é baseado em fatos verídicos, num acontecimento parecido numa cidade da Califórnia nos anos 60, e recria o ato, utilizando de dezenas de alunos capturados pela lógica proposta pelo professor a qual é rapidamente tomada contaminando outras pessoas que se juntam e levam a coisa toda a sério demais. A manipulação de massas é registrada com destreza pelas mãos de Gansel, transformando seu trabalho num dos grandes exemplares atuais alemães tal como “Edukators” e o oscarizado “A Vida dos outros”. A forma como a questão proposta em sala de aula se dissipa é assustadora, revelando a dimensão que um ideal pode adquirir.

O experimento vira fascismo
A prática propagada extrapola limites convertendo o experimento em fascismo. O laço social implantado na narrativa é questionado. “Por quem?” e “pelo que?” serão questões recorrentes ao público. Não será difícil se identificar aos vários personagens do filme, suas caracterizações felizmente não são tão estereotipadas, embora conte com os populares arquétipos. Diante a essa impregnada lógica outrora uma experiência educacional, o professor vê sua vida particular ser afetada com os alunos mais próximos e seu relacionamento conjugal ameaçado pela intolerância – Wegner é outro cegamente imerso a própria proposta.

Alguns poucos se viram contra "A Onda"
Ao mesmo tempo em que percebemos o avanço da “A Onda” entre as pessoas e o delírio impositivo que consome seus membros, vemos a discórdia de alguns menos afetados contrários ao poder iludido questionando sua propagação segregadora. Nesses momentos, valores ressaltam a crença de jovens em busca de alguma coisa que lhes façam real diferença. Vemos a costumeira e vil bebedeira entre adolescentes marcar sua geração. Na escola e fora dela, os grupos são híbridos, diagnosticando um impulso em comum entre as etnias. 

As atuações contribuem e reforçam a veracidade do longa, sobretudo no papel central. O professor é vivido pelo popular ator alemão Jürgen Vogel. Gansel transmite a sensação adolescente nos olhos daqueles que encontraram um bom motivo para viver. “A Onda” tornou-se a vida de alguns – afirmação presente em alguns discursos. A força da história se presa na relevância de um tema importantíssimo na história da civilização que emergiu numa sala de aula gradativamente. Este trabalho, encontrado em locadoras, é uma aula de arte e de cinema, cuja doutrina, para alguns distante e inacessível, está bem próxima, e não é difícil de despertar.

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