terça-feira, 22 de maio de 2012

Proseando sobre... O Corvo


Um dos caras que mais inspiraram filmes adaptados a partir de contos – entre eles "A Queda da Casa de Usher" de 1928 que teve refilmagem estrelada por Vincent Price em 1960 e “O Gato Preto” de 1934 – ganhou um filme ficcional com traços biográficos. Edgar Allan Poe vem solucionar crimes, esses cometidos por um potencial fã, uma vez estar fazendo vítimas de acordo com as histórias do escritor. Com arma e punho e até mesmo montando a cavalo em perseguição, seu famoso personagem C. Auguste Dupin é o alter ego desta concepção cinematográfica – Poe ganha faceta de herói ao lado do Detetive Fields (Luke Evans). Um frágil suspense policial banhado por literatura e história vem angariar alguns fãs e recordar o Séc. XIX.

O romancista e poeta Edgar Allan Poe teve uma vida perturbada relacionada a perdas de entes e ao alcoolismo. Frutos para suas motivações mórbidas, inseridas frequentemente em seus contos sombrios, esses atributos de vida do seu “eu” eram inspiradores e imputavam um tom melancólico, presente na encenação de John Cusack que não oferece, em qualquer hipótese, uma grande atuação, mas é ao menos empenhada. Pensa-se como justificativa a adequação do atual contexto. Temos vários exemplos disso. Citando um recente, a mutação de “Sherlock Holmes” na telona, perdendo características em favor da necessidade de atrair um outro público que não o leitor. Afinal, quantos são os espectadores de “O Corvo” que conhecem a vida de Allan Poe? Alguns nem mesmo ouviram falar de qualquer uma de suas obras.

Essa ficção baseada em um dos seus mais célebres contos, “Os Assassinatos da Rua Morgue”, é dirigida por James McTeigue do ótimo “V de Vingança”. Apostando numa atmosfera gótica pela necessidade de chamar a atenção para a estética quando a narrativa não tem grande vigor, McTeigue traça um rumo captando elementos de várias obras do protagonista, como “O Barril de Amontillado” ou “A Máscara da Morte Rubra”, entre outros citados. Não há qualquer força ou finalidade justificável por ações, com personagens soltos cuja importância nula não corresponde nem para nossa gana em desvendar o mistério sugerido ou especular o assassino que vem causando terror em Baltimore. 

Expectativas para que o público busque conhecer Edgar Allan Poe após conferir tal obra desaba ao final. A ficção toma conta, embora se apóie a eventos reais, como os dias finais da vida do romancista, andando à deriva pelos parques e ruas frias da cidade. Especulações por especulações, por mais raso que pareça, é uma adaptação, uma concepção de um longa de investigação dotado de influência literária. É uma desculpa para criar um outro serial killer baseando-se em alguma coisa que ainda não tenha sido feita. Quem sofre com tal proposta é sua estrela, o saudoso escritor. Nesse ritmo, insinuando o absurdo, até Kafka poderia ganhar um filme contando sobre sua dura relação com o pai numa Praga oprimida pelo governo, enquanto converte-se num inseto e vire atração jejuando. 

Concebido por diálogos rebuscados, especialmente veiculados ao seu genial protagonista, “O Corvo” se torna um suspense de jornal com cenas ao melhor estilo “Jogos Mortais”. Não é uma obra que em mãos, por exemplo, de David Fincher, terminaria tão morna e esquemática. Falta ousadia. Há ainda um romance ficcional motivando a trama: a seqüestrada (Alice Eve) que Edgar Allan Poe tem que encontrar é justamente quem este ama, é aquela pela qual faria qualquer coisa. Vale como estudo de uma época, uma menção a respeito do despontamento de dois grandes nomes da literatura mundial, o próprio Poe e o francês Júlio Verne, este lembrado durante a narrativa. Moldado para ser um herói, o protagonista que ganha a face de John Cusack com cavanhaque (dispensando o bigode tradicional do original), Allan Poe é celebrado de uma maneira minúscula diante sua magnânima importância.



Um comentário:

  1. Não vi o filme ainda, mas por ser um admirador da obra do Poe, estou louco para poder sentir calafrios e poder tentar viajar por meio da telona da mesma forma que faço quando leio algum conto do grande Mestre Poe. Belo texto. Fiquei mais louco pra assistir esse filme. Parabéns pelo blog. Vou divulgar.

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