Abordando, entre tantas coisas, o abuso de drogas,
“Paraísos Artificiais” leva o espectador até um vislumbre de sentidos quando
enfoca seus personagens vivenciando as mais distintas experiências em
diferentes lugares através da música eletrônica, da contemplação da natureza, lampejos
de filosofia libertária, alucinógenos e sexo. O diretor Marcos Prado, famoso
pelo ótimo “Estamira”, não poupa detalhes e cenas, buscando a intimidade dos
protagonistas, sempre muito próximo deles com a câmera, explorando detalhes de
sorrisos e prazeres num infindável templo de sensações, com segredos que se
revelam e sugestionam a partir das conseqüências de atos atingindo anos.
Vale se concentrar em quem são seus personagens centrais:
Érika (Nathalia Dill), uma jovem que sonha tornar-se uma renomada DJ e
despontar nas pistas; Nando (Luca Bianchi) é um artista talentoso sem
empolgação; e Lara (Lívia de Bueno) amante de Érika, hiperbólica, disposta a
qualquer coisa. O trio se une eventualmente numa rave e as trajetórias se mesclam
através de uma narração ilógica, compondo uma história banhada por amores e
tragédias. São jovens entregues a energia de uma vida apática, batendo as
portas do paraíso, devorando o que podem em troca de uma passividade
momentânea, fictícia.
Sem julgamentos pelas ações dos protagonistas, não há
lições de moral pelas conseqüências dos feitos, até se trabalha com uma
desresponsabilização das drogas em relação aos seus efeitos, o que não quer
dizer que as inocenta. A idéia parte da racionalização de seus usuários como
defesa. Tal escolha é benéfica para a narrativa, consciente de sua força e de
suas intenções: tratar o humano ali, naquele contexto e os resultados de
determinadas escolhas para a vida. Os reflexos disso modelam a forma do longa,
cuja cronologia nada linear as vezes atrapalha pelo excesso de informações, no
entanto não tiram o mérito de suas conclusões.
Se o tratamento dado a história submerge, a parte técnica
impressiona. As tomadas nas raves e o delírio psicodélico são captados com
elegância e precisão por Prado, evidenciado pela brilhante fotografia de Lula
Carvalho. Destaca-se nesse sentido a paranóia de Erika num determinado instante
refletindo um pesadelo inconsciente. A exaltação desse universo é entusiasmada
e empolgante, soma-se a ela a beleza natural do nordeste brasileiro com as
deslumbrantes ruas de Amsterdam. As atuações são correspondentes, especialmente
de Nathalia Dill entregue num papel ousado, atuado com coragem e determinação
intimista nesta que é sua estréia nas telonas.
“Paraísos Artificiais” soa poético, bonito, com adornos
para concluir sua desordem. Nesse âmbito, estão relações familiares e
discussões entre irmãos, Nando e o caçula Lipe (César Cardadeiro), o que
encaminha resoluções. Algumas coisas ficam no ar, aguardando a digestão do
público. Outras é melhor ignorar. Fiel a retratação vigente dos jovens da
atualidade, o longa traz uma tribo utópica distanciando-se do materialismo numa
festa desregrada. Esta obra de Marcos Prado tem o valor de um “Trainspotting”
sem personas tão icônicas, a não ser pela presença de Mark (Roney Villela) com
frases prontas de efeito.
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