A nostalgia é uma arma poderosa
no cinema. Alguns filmes nos conquistam pela identificação. Somos frágeis nesse
sentido e alvos fáceis de longas que de alguma forma nos transportam a
infância. Vários são os exemplos. Peço licença para mencionar aquele que
considero mais significativo, Toy Story
3 (Toy Story 3, 2010). Este fora capaz de mobilizar o mundo e tornar-se uma
obra prima do gênero, fechando uma trilogia marcante sendo, essencialmente,
terna, sensível, emocionante e humana. Dito isso, chego a esse Uma Aventura LEGO, pois ambos dialogam
com o espectador, promovem uma
viagem ao passado com aquele já brincou um dia, que criou mundos e se divertiu
com sua imaginação enquanto tocava os brinquedos. Comparar Uma Aventura LEGO com Toy
Story é um imenso elogio ao primeiro.
Parece uma grande brincadeira. Uma Aventura LEGO é uma animação divertidíssima!
Podemos estranhar numa primeira olhada a dinâmica dos bonecos e os quadros. Mas
o desenho de produção traz cuidadosamente os detalhes mais meticulosos do
brinquedo – a água, o fogo, as munições – e garante nossa interação como se fizéssemos
parte da brincadeira. O desenho é quadradão e isso o deixa ainda mais
interessante e, por que não(?), real. Real por que é assim que se brinca com
LEGO, elaborando coisas, criando o tempo inteiro. Os bonecos não são
articulados e isso é mais uma piada: a cena do polichinelo, por exemplo, é bizarramente
cômica.
Imagina-se a perfeição, fazer as
coisas seguindo tempo e regras, tudo de acordo com normas e manuais, nunca
saindo do controle. Assim se tem um dia perfeito. Essa consideração midiática
de perfeição mantém o controle da população. O tempo passa, nada muda. E não mudando,
não há estresse. As constatações de tal falta de progresso de alinha aos moldes
de uma sociedade incauta, que consome o que mandam consumir, que vivem conforme
pede a insistente canção. É uma particularidade trabalhada em meio a narrativa
com universos construídos que logo são desconstruídos, desfeitos em blocos, perspectivas
de mudança que fariam Winston de George Orwell assentir.
Subvertendo paradigmas
costumeiros em desenhos, a obra da dupla de roteiristas e diretores Phil Lord e
Christopher Miller permite uma interação diferente com o espectador. Segue uma
linha óbvia através de uma história simplória desenvolvendo-se livremente e
energicamente, quase sem pausas. Piadas estouram em gags, diálogos e
especialmente em referências – essa última diz respeito a linha de brinquedos
lançados através dos anos trazendo personagens da ficção e grandes nomes da
história. Acompanhamos um construtor, considerado por todos um alguém comum que
não carrega nada de especial. São dele as invenções mais desastrosas, sua
estima se esvai à medida que descobre a indiferença alheia. O roteiro se preocupa
em trabalhar essa idéia como uma moral necessária. O tema é calejado, porém
aqui ganha outra vertente, especialmente quando se direciona para o final onde
descobrimos que...
Tantas referências empolgam,
deixam o filme ainda mais recreativo. Os fãs do brinquedo certamente pegarão
mais designações que o espectador comum. E o herói de toda história não é um
só, mas é simbolizado por um operário (não poderia escolher outra profissão
melhor), o carismático Emmet que vive na sombra do Batman (o melhor personagem
da história). Bonito, criativo e originalíssimo, Uma Aventura LEGO acertará as crianças, no entanto deverá ganhar
mesmo a atenção dos adultos. E como é bom idealizar, desconstruir, reconstruir
e formar constantemente. E onde mais é possível unir figuras como o presidente
Lincoln, Michelangelo (o artista e a tartaruga ninja), Shaquille O'Neal,
Gandalf, Dumbledore, Lanterna Verde e tantos outros num só local? Somente na
imaginação, no sonho, e vemos tudo isso através da arte do movimento,
fotografado e exibido com uma ternura tocante.
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