Cercado por lendas orientais, um dos contos mais
célebres japoneses ganhou as telonas através de mãos americanas. Historicamente
foram várias as adaptações para o cinema, uma em especial permanece na memória
cinéfila: A Vingança dos 47 (Genroku Chûshingura, 1941) de Kenji
Mizoguchi. Já essa nova versão, estrelada por Keanu Reeves, vaga por outros
caminhos. A obra é baseada num acontecimento lá do século XVIII envolvendo um
grupo de samurais. Nessa nova concepção, para o regozijo americano, criaturas
fantásticas foram inseridas – monstros e feiticeiras – e adaptaram a famosa
história pensando que fariam dela ainda mais impressionante. Conseguiram
realizar uma grande bomba. O diretor Carl Rinsch, estreante em longas, viu seu
nome manchar antes mesmo de se tornar minimamente relevante.
Um grupo de ronins busca vingança. Seu mestre foi
morto e sua terra invadida. Circunstâncias que fogem a história original – o
que não é um problema, já que trata-se de uma adaptação – dão o tom fictício da
trama, envolvendo interessados por distintas mitologias. Tanto desperdício. É
entretenimento audiovisual dispensável, um circo cheio de despropósitos,
buscando diversão sem lógica. A corrida atrás de um monstro, por exemplo, é um
acontecimento nulo, uma vez que a criatura não tem qualquer relevância na
trama. Carl Rinsch não consegue manter um ritmo e se perde na coordenação dos
atores e na ação carimbada.
Felizmente algumas ideias originais persistem,
como o seppuku, um ritual suicida; e a saga dos heróis atravessando feudos no Japão.
Aos fãs dessa cultura, tais cenas ganharão alguma notoriedade. O orgulho
daquele povo se mantém, parece compreendido pelos ocidentais, e é a nossa
curiosidade a cerca de seu resultado que nos mantém atentos até o fim da
projeção. Outras coisas incomodam, como os personagens falando em inglês e
escrevendo em japonês. Todavia relevamos.
A verdade é que 47 Ronins é falho em quase
tudo o que propõe. Acerta no tom da fotografia e ambientação, assegurada por um
bonito desenho de produção – a cultura oriental favorece a estética –, mas a
relevância disso em tempos atuais são banais. A história ostensiva
termina medíocre e rasa, graças a um roteiro descabido, demasiado didático,
subestimando a inteligência de quem o acompanha. Parece adaptado para um público
juvenil. Plasticamente atraente, o filme sofre para engatar, sendo
verdadeiramente entediante. Desconfio que os problemas da produção não sejam
desculpa para sua vagarosidade e abnegação. O longa estacou por mais de um ano
até ser terminado. O gigante fracasso de bilheteria é um forte soco de
realidade nesse que já é considerado um dos piores filmes lançados recentemente
em todo o mundo. Ele coleciona rejeição de público e crítica. O público está
amadurecendo e ficando mais crítico ou cansaram de entretenimento desse tipo?
Produções similares vem enfrentando o mesmo problema.
Tantos conceitos foram jogados fora a troco de um
convencionalismo fútil que fica impossível não olhar para o cinema e percebê-lo
diminuído por grandes produções medíocres que mensalmente explodem nas telonas.
E falando em convencionalismo, até aqui temos um alívio cômico que parece ter
saído de algum pastelão hollywoodiano, um samurai obeso que promove algumas
piadas. Nesse 47 Ronins nem os bons atores seguraram a carga dramática
exigida pela tragédia envolvida, pela representação histórica, pela filosofia
que ajudou a moldar o oriente e pelo significado do ser um Samurai. Ou Ronin. O
astro Keanu Reeves está em um de seus piores momentos, insípido e
desinteressado, certamente por saber que estava envolvido com uma bomba. A
própria produtora Universal já supunha quando constatava os problemas a cerca
do tempo de produção. Já Rinko Kikuchi, que ganhou prestígio graças ao ótimo Babel
(Idem, 2006), consegue dar alguma dignidade a sua feiticeira. 47 Ronins
não encontra um viés para o protagonista e sabota miseravelmente o sentido
daqueles que desejou homenagear.
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