Com personagens em suspensão, Kill Me
(idem, 2012) de Emily Atef conta uma história sobre o decesso no
decurso de um encontro casual entre um fugitivo e uma camponesa. A ideia
é discutir possibilidades ao passo que seus personagens se revelam
enquanto uma estranha negociação é concluída. Nesse meio, após o filme
ser convertido num refreado road movie, somos levados a questionar os
princípios dos protagonistas a medida que seus anseios de fuga e
auto-destruição se esclarecem. Sem melodramas usuais e obviedades
dramáticas interessadas em condensar a narrativa num drama melancólico
sobre a finitude, Atef entrega uma obra coesa e profunda, cada vez mais
intrínseca e mais torrencial.
Um fugitivo consegue escapar de um presídio e,
ferido, se esconde num cômodo numa fazenda. Lá reside uma adolescente
com seus familiares num clima pouco amistoso, frio e distanciado. A
diretora expõe em imagens obscuridades dessa relação deixando o
espectador curioso sobre o motivo daquela inércia familiar. De antemão,
no princípio, observamos a garota a beira de um precipício, a um passo
do suicídio que tanto almeja, mas que não tem coragem de fazer. Ao se
deparar com o fugitivo em casa, ela inesperadamente lhe propõe: ela lhe
tira daquele lugar em segurança, levando-o até alguns caminhões de carga
que atravessam o país, se, ao final, ele lhe empurrar de um precipício.
Aceito.
Seguiremos a partir desse ato duas evasões: em
primeira instância Timo (Roeland Wiesnekker), fugindo da polícia alemã
após ter sido condenado por assassinato; e Adele (Maria-Victoria Dragus)
cuja vida inanimada não tem qualquer brilho ou cor – isso também é
visto artisticamente através da fotografia que modela a menina com
sombras. Sem progressos e assumindo um ofício que não diz respeito a si,
comprometendo seu crescimento, a menina encontra auxílio na morte,
pulsão natural de sua condição árdua. Uma bela cena, embora simples, que
retrata com naturalidade a infância que não teve, quando se disfarça
jogando futebol ao lado de outras crianças e percebe um entusiasmo ainda
não experienciado, como uma criança privada de algum doce e
repentinamente o provando, deliciando-se. As sombras se dissipam e a
fotografia trabalha com cores mais quentes.
A narrativa se desenrola e várias coisas acontecem,
acometendo os dois durante a jornada. Há ainda a beleza paisagística
notável dos campos esverdeados e florestas na fronteira franco-alemã,
garantindo um belo visual para a corrida entre a dupla que no segundo
ato assume uma nova postura cênica dentro do filme: um seqüestro. Aí vem
novos fundamentos na relação de ambos, confidentes e parceiros em
detrimento dos outros. É preciso atravessar a fronteira e chegar até a
França. E o trato entre Timo e Adele, será realizado? A perspectiva
detalhada nas nuances dessa relação bem desenvolvida pelo roteiro parece
direcionar a uma solução evidente. Dragus atua com passividade, ideal a
sua personagem, enquanto Wiesnekker dá ferocidade temperamental a Timo
com uma misteriosa altivez. Ao final, um abismo diante à imensidão do
mar. Simbolicamente demonstrado no filme, às vezes as pessoas esperam um
empurrão. Isso é tudo que alguns precisam.
* Crítica originalmente publicada em http://www.cineplayers.com/critica.php?id=2532
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