segunda-feira, 6 de agosto de 2012

Proseando sobre... Para Roma, Com Amor


Woody Allen rompe outra vez com a parede cinematográfica. Um de seus personagens, um guarda de trânsito, olha para o espectador e dialoga com ele de um modo semelhante ao feito por Larry David em “Tudo pode dar certo”. Nós somos convidados a apreciar o que virá. Esse guarda serve como introdução as histórias e também a exuberante Roma, cidade que irá inspirar os personagens e permitir que esses vivam grandes experiências. Banhado pelo humor intelectual do diretor e de críticas sobre celebridades banais, “Para Roma, com Amor” é uma dedicatória romantizada aos casais que passam pela cidade e vivenciam seus encantos irresistíveis.  

De início, veículos andam bagunçados atravessando ruas tentando ganhar ordem por um guarda. De maneira análoga as pessoas invariavelmente se cruzam ou se chocam com outras. No entanto a ordem não se estabelece com o amor. É o que Allen parece querer provar. Vários contos se desenrolam pela narrativa escrita pelo próprio diretor. Atentem-se que este também é o retorno de Allen frente às câmeras, algo que não ocorria desde “Scoop”. Nesse cenário rico em arquitetura, acompanharemos uma expedição sobre famosos pontos turísticos numa terra em que Federico Fellini, um dos diretores mais influentes da carreira de Allen, viveu.

Uma das várias histórias contadas durante a narrativa diz respeito ao estudante Jack (Jesse Eisenberg) que, segundo o próprio, inexplicavelmente se interessa pela retórica Monica (Ellen Page), uma turista americana. Outra história relaciona-se ao casal Antonio (Alessandro Tiberi) e Milly (Alessandra Mastronardi) que em locais diferentes, são levados a vivenciarem distintas confusões: o rapaz é obrigado a fingir que a prostituta Anna (Penélope Cruz, novamente bela) é sua esposa, enquanto a moça se encontra com um famoso galã do cinema italiano no meio da rua durante filmagens. 

Essas são duas histórias que não se colidem, mas que coexistem na mesma cidade, igualmente a tantas outras, como em qualquer outro lugar. O charme, por sua vez, distingue-se aqui. É notável a sugestão da maturação pessoal por parte desses perdidos e frágeis seres se reconhecendo e aprendendo enquanto se permitem experienciar a paixão – mesmo que essa se refira, por vezes, ao adultério. É uma pulsão sexual irresistível a qual, aparentemente, a cidade inspira. Com tantos personagens em cena – o diretor parece retomar um pouco a idéia do esplêndido “Meia Noite em Paris” – essa empreitada não atinge o nível de sua realização na capital francesa. É bastante vago em alguns atos e pouco inspirado em algumas piadas, sobretudo quando essas não são ligadas ao personagem de seu diretor, o megalomaníaco Jerry. 

Há um identificável trato pessoal de seu realizador com Jerry, seu alter ego. Algumas sentenças soam como confissões do próprio Allen. Uma produção por ano, é uma média ousada que o diretor mantém.  Mas tal média acarreta um problema, o nível variado entre uma produção comparada com a outra. Embora raramente faça filmes ruins, ele não consegue manter a excelência de suas grandes obras. Por exemplo, resta na memória dos cinéfilos belezas como “Noivo Neurótico, Noiva Nervosa” e “Manhattan”. Já num passado recente, “Meia Noite em Paris” e “Vicky Cristina Barcelona” são preciosidades incomparáveis. “Para Roma, com Amor” está, infelizmente, bem a baixo das citadas. 

A obra sofre com ritmo e com uma montagem que não dá sintonia as várias histórias. Cortes secos nos direcionam a outro contexto. É um intercalamento estranho, como de cenas com romance emergente se estendendo as que se destinam a críticas cômicas atribuídas as celebridades. Nesse âmbito, Allen trabalha com o ótimo comediante italiano Roberto Benigni que representa um homem comum que subitamente vira famoso, despertando interesse da mídia para questões cretinas – como que tipo de cueca ele usa. Este sai distribuindo autógrafos sem entender qual seu feito. Aí entra a contradição da experiência quando a fama deixa de existir, restando a melancolia de uma fantasia sobre importância. Reais sucessos estão adormecidos em pessoas que se julgam simples demais para serem vistas. Caso do cantor de ópera que consegue ser excepcional somente de baixo do chuveiro, ato que nos leva a um finalmente ridiculamente divertido. 

Diante de tantos personagens, romances e sentidos de existência empregados, chegamos ao arquiteto John (Alec Baldwin), o mais interessante em toda a trama. A poesia oferece uma licença poética para fugir das tradicionais normas, o cinema também pode usufruir de tal auxílio. John interage com os personagens, mas ele não existe, ao menos não fisicamente. Ele é, em suma, um retorno ao passado do jovem Jack, mas desta vez vivido, compreendendo melhor os assuntos e aconselhando segundo as próprias experiências. Lembra de “A Rosa Púrpura do Cairo”? O absurdo é poético e muitas vezes divino, algo que engrandece o cinema de Allen. E o conceito de experiência de vida parece ser algo forte nesta trama que explana vivências e o pós destas, como se concedesse a prática do experimento os resultados de satisfação ou decepção pessoal, sendo positivo pela maturidade ganhada graças as escolhas e consequências. Através disto, os personagens de Woody Allen crescem.


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