A beleza que inspira, que se
choca com nossa percepção do belo nos fazendo projetar o que contemplamos em
jubilo. A musa que encanta cuja lascívia emanada extenua o desejo de quem a vê.
“Eu Receberia as Piores Notícias dos Seus Lindos Lábios” é um
conto romântico e poético sobre a desordem e as tragédias que envolvem o
consumo da beleza levando ao seu desgaste e possível fim. Passado numa
população ribeirinha no Pará, o filme explana a sociedade local sobrepondo sua
paisagem e as destruições do desmatamento que vem assolando a região de maneira
descontrolada. Tal fato relaciona-se diretamente a conduta de seus personagens
com o simbolismo de suas idealizações e a extenuação do que outrora lhes fora
formoso.
Um trio forma a
narrativa. Ernani (Zé Carlos Machado) vislumbra uma cura da terra e das
pessoas, expondo discursos ideológicos apoiados por sua crença: ele representa
a palavra; Cauby (Gustavo Machado) é um fotógrafo que se permite encantar com
belezas e procura a todo instante modelar uma forma ideal que ainda não
encontrou em seus modelos: ele representa o olhar; Lavínia (Camila Pitanga) é
resgatada pelas palavras e pelo olhar, cada qual sugerindo um destino. Ela é a
constituição do desejo apropriado.
O filme tem início com uma mulher
nua em pose sexual olhando para a câmera. Uma índia. Nesse momento somos os
observadores aturdidos pela composição visual da imagem que conta com um ser
sedutor. Ela é a representação da musa. Um fade, e adentramos definitivamente
na história. O diretor Beto Brant que já concebeu bons projetos
como “Cão sem Dono” e “Crime Delicado” investe numa narração recortada, contando
distintos momentos de seus protagonistas como um quebra cabeça ao passo
que elabora alusões ao contexto através de elipses. O olhar, algo
importantíssimo na trama, salta de lugar a outro, de história a outra, de
tempos a outros. Como os recortes de seu fotógrafo que expõe nas paredes
retratos de sua estrela, a história mescla vários eventos explorando Lavínia, seu
furor e sexualidade.
Tudo acontece por um sentido
nesta trama escrita por Marçal Aquino, – parceiro e amigo do diretor, ele
também é dono do romance homônimo que inspirou este filme – com a maioria dos
eventos ligados a condição de posse. Os corpos se despem e o desejo carnal aflora.
Camila Pitanga se entrega, está nua e isso importa para as pretensões da
narrativa que não faz da nudez gratuita. Como foco de idealização, o corpo deve
aparecer. E aparece. As cenas esquentam, as cores fortes estilizadas contribuem
e a fotografia exerce papel fundamental para elaborar a retratação cálida. A
atriz dá fulgor à tempestuosa Lavínia, sempre acometida por sentimentos
contraditórios, carregando no olhar uma melancolia confusa.
Há ainda um importante
desencadeador na história que não está presente entre o trio. Um quarto
personagem, o jornalista Viktor (Gero Camilo). Ele é amigo próximo de Cauby e,
em costumeiros encontros, narra passagens literárias que dizem respeito às
ocorrências da trama. Um estímulo externo para o comprometimento de relações. E
o resultado disso é penoso, abrigando passado e presente num ciclo de
acontecimentos e de omissões fragmentadas em passagens temporais. Servindo também
como um potencial filme-denúncia devido aos planos que registram deformidades
da floresta amazônica, o longa ainda retrata defesas de humanos frente às
frustrações, acarretando a saúde mental e social. Como seu título indica, esta
é uma obra de apegos e serenidade reconfortante. E é admirável notar, ao final,
um olhar lançado ao público, deixando uma interrogação.
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