Tim Burton retoma sua saudosa
parceria com Johnny Depp e com sua esposa Helena Bonham Carter numa fantasia de
horror, gênero que domina como poucos. O universo tratado se relaciona a
vampiros, é livremente baseado na série televisiva de Dan Curtis, com a
disposição da genialidade e notável criatividade do cineasta. De teor gótico e
princípio fantástico, acompanharemos uma história que abriga gerações, trazendo
clichês do terror – entre eles espíritos rondando por corredores e fantasmas
com lençóis – a favor de uma trama atemporal. Ainda soma-se a essa brincadeira
neste talvez mais infantil filme do ponto de vista dramático de Burton a
geração setentista, as músicas da época e aspectos kitschs dentro da contracultura
hippie. E olha, Alice Cooper, Yeah!!! Não faltam piadas relacionadas a esse
choque cultural.
Um problema da narrativa é o
distanciamento dos personagens. São tantos e são poucos os que despertam
interesse ou pelo menos tem tempo para isso, ficando a maioria distanciada,
subjugada não só a serem secundários, mas soando desnecessários, o que não
desperta qualquer reação do público por suas ações, às vezes negativamente
surpreendentes. Já a disposição dos mesmos em cena é brilhante, característica
marcada de seu realizador que utiliza da direção de arte para explorar
personalidades e salientar figuras unidimensionais. O visual é o expoente do
filme, a máxima de Burton, capaz de conceber universos góticos como poucos,
usando esse aspecto a favor da narração e dos gêneros e subgêneros que por
vezes destoam vislumbrando outras funções na trama. E é tão bom acompanhar
isso, nos levando diretamente a obras análogas, sucessos que tornaram o diretor
distinto e Cult. Impossível não se recordar de “Os Fantasmas se Divertem”.
O ponto inicial é ótimo,
alucinante e bem explicado, contando um pouco o passado de seu protagonista, Barnabas
Collins (Depp), e o que lhe fez dormir por quase 200 anos acordando na década
de 70. Seu caso amoroso com Josette (Bella Heathcote) fora sabotado pela bruxa Angelique
Bouchard (Eva Green, ótima), o trauma se arrasta por séculos trazendo conseqüências
para sua família que já não dota do mesmo prestígio e riqueza. O despertar pós
séculos do vampiro vem em clima de horror com comédia, funcionando sobretudo
graças aos típicos trejeitos de Depp que compõe uma figura inusitada, cômica e
caricata. Seus gestos e gags são heranças de outros de seus personagens com o
acréscimo, talvez involuntário, da dicção do Abe Sapien de “Hellboy”, vivido
por Doug Jones. E uma vez mencionar Depp e Green, vale ressaltar que a dupla
protagoniza uma das cenas de conotação erótica mais enlouquecida e divertida
dos últimos tempos. Quanto a Bonham Carter, essa vive uma psiquiatra, Dra.
Julia Hoffman, e participa de uma boa cena baseada na função da hipnose e no
poder de influência vampiresca.
Nesse filme de grandes pequenas
histórias, as resoluções decepcionam, e mesmo o bom elenco não ajuda. Há
bons detalhes que indiciam o que está rolando, como exemplo a cena em que a
Dra. Julia entra para tomar café e pede que as cortinas sejam fechadas. O final
constrange com surpresas tolas e situações embaraçosas. Chloë Grace Moretz que
vem em grande ascensão entrega mais uma atuação intrigante. Muito jovem, se
mantém num fluxo de bons momentos na telona, entre eles este aqui, caminhando
até um desapontamento final minando a complexidade de sua personagem numa
revelação apressada e enfadonha. Sua motivação e razão é nula, afinal, a
família Collins ainda buscava uma interação íntima. Os resultados então são
ínfimos. Sofrendo da mesma maneira está o pequeno Gulliver McGrath com seu
David Collins. Michelle Pfeiffer, ainda dotando de imensa beleza, consegue
algum tempo de atenção como a anfitriã Elizabeth Collins, descendente do
vampiro. Junto a ela, o ótimo Jackie Earle Haley dá dignidade apreensiva com sua
feição marcante ao criado Willie. Jonny Lee Miller que encarna o interesseiro Roger
Collins fecha a turma dos esquecidos. Há ainda uma boa ponta de Christopher Lee
escondido atrás de barba e chapéu.
Com atributos significativos do
gênero que tão bem trabalha, Tim Burton presenteia seus fãs com uma película
nova sem força, profundidade e interesse comparada a outras obras passadas,
dando um pequeno salto após a fraca adaptação de “Alice”, o que representa uma
triste comprovação de declínio. Com muito a fazer pelo cinema e com tanta
criatividade atualmente mal distribuída, que Burton mostre que os bons momentos
desse “Sombras da Noite” possam referenciar um leve despertar do que há de
melhor em sua carreira e significar, mas do que qualquer outra coisa, um sinal
de retorno aos seus tempos de maravilhas.
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