Nos últimos anos, tem sido comum
observar filmes de heróis emplacarem e arrecadarem milhões em bilheterias. Uns
possuem qualidade discutível, outros triunfam pela diferenciação técnica, no
entanto a maioria apenas soma, acumulando nas prateleiras como mais uma opção, apenas
um outro conflito maniqueísta e esquemático de roupagem singular. Alguns desses
provém de grandes sucessos solos, como “Thor” e o “Capitão América”; o “Homem
de Ferro” consolidou uma franquia de êxito ao passo que “Hulk” obteve filmes
questionáveis. Com isso, uma expectativa em relação a reunião do grupo e a
constituição dos Vingadores inflamou quando Nick Fury (Samuel L. Jackson) surgiu
recrutando os personagens. Há muito tempo prometido, o aguardado filme reunindo
estes protagonistas da Marvel finalmente chegou às telonas trazendo tudo o que
seus fãs desejavam ver: um expoente e superlativo filme de ação com figuras
ilustres dos saudosos quadrinhos.
O planeta está ameaçado por
forças alienígenas trazidas pelo asgardiano Loki (Tom Hiddleston) que invadiu a
S.H.I.E.L.D roubando o Tesseract. O ataque é caótico, Nova York está sendo
destruída. Os humanos com suas limitações pouco podem fazer. O desígnio de Fury
é a possível solução para a defesa da terra. Com efeitos especiais eficazes e
com uma produção generosa, o projeto muito bem dirigido e escrito por Joss Whedon é impactante, se estonteia pelo absurdo, metaforizando a
iminência do fim e o cuidado que, numa sociedade destrutiva à espera do remate
ocasionado pela própria, é esperado do homem em busca de solução.
Unir tanta gente numa só obra é
uma aposta das mais perigosas. Cada um teria tempo de mostrar a que veio?
Alguns são priorizados, certamente, porém ninguém sai depreciado. Os heróis
juntos tem medida suficiente em cena para impressionar cada um a sua maneira,
seja pela ironia ou pelas sutilezas, estabelecendo um vínculo com seu público
sedento pela diversão pipoca, oferta natural e desejável quando se trata de
longas deste gênero.
O equívoco passado pela própria
Marvel há alguns anos, no caso o terceiro Homem Aranha, onde o excesso de
antagonistas comprometeu o andamento da empreitada tornando-a por vezes maçante,
parece ter sido um aprendizado para este projeto a fim de que tal problema não fosse
repetido. Aqui tudo está bem amarrado com um roteiro afinado à proposta de distração
sem temer o absurdo e tampouco o humor voluntário, este funciona não só como um
alívio diante a ação estupefata, mas como um acréscimo de ânimo às investidas
dramáticas nunca aprofundadas. Não é para se levar a sério em qualquer
hipótese.
E justamente por não querer ser
levado a sério é que a história contada não ultrapassa a barreira da diversão
contagiante. Embora levante questões importantes relacionados aos seus personagens
no atual contexto, nada vai além de uma menção, o que torna tudo por vezes
juvenil. A falta de profundidade é driblada por carisma e humor. Tal ousadia
tão produtiva é encarada como um revés, podendo afastar alguns públicos do
cinema graças a possíveis complexidades. Há um solo fértil para tal
investimento, todavia ousar fazê-lo requer muita competência e coragem. Fica a
deixa, subestimando a capacidade intelectual de seus espectadores.
Num roteiro que
discute moral através de desentendimentos e rixas pela diferença, sobretudo de
época e de lugar, o longa de Whedon exprime convicções sobre o coletivo e seus
variados ideais. A narrativa é o herói em si, esse papel apreciado e seguido,
embora, socialmente, debatido, segundo os valores estabelecidos. Daí divergem
concepções, uns constatando como amparo enquanto outros sugerem aberrações, o
ser diferente que assusta, importuna. O horror social com o que nos é estranho
está presente nessa alegoria imaginária dos quadrinhos.
Tony Stark se estabelece como o
durame da narrativa, as coisas não acontecem em sua volta, mas se inclinam ao
seu ego megalomaníaco. As melhores sacadas do texto são dele, desenvolvidas com
graciosidade por Robert Downey Jr.. Thor mantém a imponência de um deus graças
à vaidade de Chris Hemsworth enquanto Chris Evans garante o tom enérgico de
Capitão América exalando americanismo. 3 armas cujos poderes notáveis
dignificam Os Vingadores. Entre os heróis a coisa melhora quando Mark Ruffalo
aparece com seu Hulk, provavelmente o melhor concebido pelo cinema. Aperfeiçoado
e bruto como nunca visto, remete a Dr Jekyll and Mr Hyde, e ainda é capaz de
fazer o público no cinema ovaciona-lo por sua violência desmedida constatada em
atos estranhamente bem humorados com direitos a gags visuais cômicas.
Em outra instância, outros dois
personagens se equivalem sem os aparatos fantásticos dos já mencionados. A
Viúva Negra com sua autoridade e eficiência se garante como um dos atributos
mais significativos da trama em diálogos entusiasmados, ao mesmo tempo que esbanja
sensualidade. Scarlett Johansson, esforçada no papel, incendeia. Já o ótimo Jeremy Renner dá dignidade ao seu Gavião Arqueiro em dois
âmbitos importantes da narrativa, edificando um herói de guerra, nunca
preparado para um confronto universal como o acontecido.
Ostentações técnicas sobressaem
cena a cena, o som é expressivo, ouvimos com destreza o barulho da flecha do
Gavião Arqueiro ou as latarias amassando. Já a trilha não tem novidades,
empolga num dado instante cuja música clássica embala a ação de Loki na
Alemanha com um sobrevivente do nazismo negando em se ajoelhar. As aspirações
são tremendas e eloqüentes, e a produção constata isso: um filme de explosões,
efeitos surpreendentes e adornos floreados. É sumo e acena com o sucesso e com
um futuro promissor. De longe, é o mais expressivo trabalho da Marvel,
garantindo um sorriso nos fãs das HQ’s que é, sem dúvidas, muito mais
importante que qualquer outro resultante.
“Os Vingadores” honram esses
heróis da Marvel com a magnificência de uma grande produção cujo divertimento
proposto é virtuoso. Divertido, engraçado e enérgico, o longa se fundamenta no
que seus fiéis apreciadores querem e cumpre elegantemente a expectativa desses.
Supondo que a idéia de Stark enquanto um herói trabalhando sozinho seja destituída
do longa pela exigência das situações e pelo senso de justiça – e um motivo
inspirador é levantado –, como denuncia uma cena num letreiro, a letra “A”
parece perpetuar um novo paradigma ressaltando a inicial de “Avengers”, representação
de unificação, totalizando diferenças como possibilidade real do sucesso.
Dividir para conquistar, reunir para defender. E que defesa ao cinema popular a
concepção dessa grandiosa produção.
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