Venderam mal o filme. Difícil não encara-lo como uma típica comédia banal de nosso cinema. “O Homem do Futuro” tem potencial para ser cult, tem elementos para aspirar grandes distinções. Concebido pelo imaginativo Cláudio Torres, o mesmo por trás do bom “Redentor” e do descartável “A Mulher Invisível”, este filme que capta muito bem viagens no tempo se condensa como uma experiência apaixonante sobre um assunto compartilhado por humanos, o “e se”. E se tivesse feito isso, e se tivesse dito aquilo, poderia ter sido diferente? Questão recorrente, inevitável quando se vive, erra e aprende. E com o perdão de uma pequena alteração de pronome na letra da esplendorosa canção de Renato Russo, “Tempo Perdido”, que embala o filme, delinho a proposta do longa: “todos os dias quando acordamos, não temos mais o tempo que passou, mas temos muito tempo, temos todo o tempo do mundo...”.
Zero é um físico quarentão frustrado por uma vida de arrependimentos cujas lembranças atormentam como fantasmas. Recluso no mundo científico, sozinho e enfurecido, é reconhecido por promissoras pesquisas estando a ponto de criar uma energia sustentável capaz de mudar o mundo. Porém, o teste o leva até a data determinante de seu futuro, uma noite inesquecível pela experiência do amor e do abandono. E se fosse diferente? Inicia-se uma interação de personagens com 20 anos de diferença centrando em Zero procurando convencer sua versão mais jovem de fazer as coisas de um outro modo. As conseqüências disto levarão o filme a uma viagem sensorial e oportuna sobre aquilo que fazemos sobre nós mesmos.
Cláudio Torres ilustra o longa com artifícios recorrentes das distintas épocas, contrapondo a tecnologia recente com a vivacidade do início dos anos 90. Sobre isso, o trabalho de fotografia de Ricardo Della Rosa assinala a distinção juntamente a canções de outros tempos, passando por INXS, Radiohead, Ultraje a Rigor e Legião Urbana – aliás, com isso, percebemos o quando decaímos no sentido musical. É inevitável a comparação, ou referência, a “De volta para o Futuro”, e tampouco esquecer das inferências de “Efeito Borboleta”, no entanto, “O Homem do Futuro” é honesto e original no que propõe sem pretensões. Zero está diante oportunidades de se fazer um novo futuro a partir de qualquer alteração no passado. O foco é um amor perdido, Helena, representada por Alinne Moraes, sem exageros em cena.
“A tempestade que chega é da cor teus olhos, castanhos...” Helena entusiasma e aquece o coração de um solitário universitário que jamais imaginou poder estar com uma mulher como ela. E numa noite tempestuosa, onde uma brisa trouxe um êxtase anunciando uma tempestade aterradora que deixaria Zero em pedaços, um caminho foi trilhado. Seria uma perspectiva simples caso não tivesse o reforço de Wagner Moura que encarna Zero com um entusiasmo edificante dando ciência e autenticidade em seus personagens de distintas épocas, evocando o entusiasmo do prazer, a repercussão da traição e a conscientização da necessidade de ser. Acompanhá-lo em sua jornada é um trabalho aprazível para qualquer cinéfilo, evocando proximamente o percurso de “Corra Lola, Corra”.
Torres elabora um romance de uma maneira satisfatória, enfatizando o papel do tempo em nossas vidas, enriquecendo o cinema nacional e provando que assuntos relacionados a viagens no tempo e futuro não estão esgotados, vide um outro bom exemplar brasileiro dirigido por Philippe Barcinski, “Não por Acaso”. Há tanto a se pensar e muito a se divertir, mas no final, trata-se de um drama socialmente comum, com a conjuntura de um personagem em poder mudar e sofrer os efeitos desta chance. No elenco também estão Maria Luisa Mendonça divertidíssima e Fernando Ceylão como um grande amigo de Zero. Nessa ótica, levamos algumas coisas por toda a vida, no caso, a amizade. Desfrutar dessa experiência afirmada por um roteiro interessante e dinâmico, embora falho em alguns aspectos, nos faz lembrar de que nada que vivemos e do que fazemos é tempo perdido, mas parte de nossa irredutível história, afinal, temos nosso próprio tempo... temos nosso próprio tempo.
Tenho muita curiosidade em conferir, parece ser uma produção nacional diferenciada muito interessante.
ResponderExcluirhttp://cinelupinha.blogspot.com/
Muito bom o texto, até me motivou a vê-lo no cinema!
ResponderExcluirValeu até mais!