domingo, 4 de setembro de 2011

Proseando sobre... O Homem do Futuro

 
Venderam mal o filme. Difícil não encara-lo como uma típica comédia banal de nosso cinema. “O Homem do Futuro” tem potencial para ser cult, tem elementos para aspirar grandes distinções. Concebido pelo imaginativo Cláudio Torres, o mesmo por trás do bom “Redentor” e do descartável “A Mulher Invisível”, este filme que capta muito bem viagens no tempo se condensa como uma experiência apaixonante sobre um assunto compartilhado por humanos, o “e se”. E se tivesse feito isso, e se tivesse dito aquilo, poderia ter sido diferente? Questão recorrente, inevitável quando se vive, erra e aprende. E com o perdão de uma pequena alteração de pronome na letra da esplendorosa canção de Renato Russo, “Tempo Perdido”, que embala o filme, delinho a proposta do longa: “todos os dias quando acordamos, não temos mais o tempo que passou, mas temos muito tempo, temos todo o tempo do mundo...”.

Zero é um físico quarentão frustrado por uma vida de arrependimentos cujas lembranças atormentam como fantasmas. Recluso no mundo científico, sozinho e enfurecido, é reconhecido por promissoras pesquisas estando a ponto de criar uma energia sustentável capaz de mudar o mundo. Porém, o teste o leva até a data determinante de seu futuro, uma noite inesquecível pela experiência do amor e do abandono. E se fosse diferente? Inicia-se uma interação de personagens com 20 anos de diferença centrando em Zero procurando convencer sua versão mais jovem de fazer as coisas de um outro modo. As conseqüências disto levarão o filme a uma viagem sensorial e oportuna sobre aquilo que fazemos sobre nós mesmos.

Cláudio Torres ilustra o longa com artifícios recorrentes das distintas épocas, contrapondo a tecnologia recente com a vivacidade do início dos anos 90. Sobre isso, o trabalho de fotografia de Ricardo Della Rosa assinala a distinção juntamente a canções de outros tempos, passando por INXS, Radiohead, Ultraje a Rigor e Legião Urbana – aliás, com isso, percebemos o quando decaímos no sentido musical. É inevitável a comparação, ou referência, a “De volta para o Futuro”, e tampouco esquecer das inferências de “Efeito Borboleta”, no entanto, “O Homem do Futuro” é honesto e original no que propõe sem pretensões. Zero está diante oportunidades de se fazer um novo futuro a partir de qualquer alteração no passado. O foco é um amor perdido, Helena, representada por Alinne Moraes, sem exageros em cena.

“A tempestade que chega é da cor teus olhos, castanhos...” Helena entusiasma e aquece o coração de um solitário universitário que jamais imaginou poder estar com uma mulher como ela. E numa noite tempestuosa, onde uma brisa trouxe um êxtase anunciando uma tempestade aterradora que deixaria Zero em pedaços, um caminho foi trilhado. Seria uma perspectiva simples caso não tivesse o reforço de Wagner Moura que encarna Zero com um entusiasmo edificante dando ciência e autenticidade em seus personagens de distintas épocas, evocando o entusiasmo do prazer, a repercussão da traição e a conscientização da necessidade de ser. Acompanhá-lo em sua jornada é um trabalho aprazível para qualquer cinéfilo, evocando proximamente o percurso de “Corra Lola, Corra”.  

Torres elabora um romance de uma maneira satisfatória, enfatizando o papel do tempo em nossas vidas, enriquecendo o cinema nacional e provando que assuntos relacionados a viagens no tempo e futuro não estão esgotados, vide um outro bom exemplar brasileiro dirigido por Philippe Barcinski, “Não por Acaso”. Há tanto a se pensar e muito a se divertir, mas no final, trata-se de um drama socialmente comum, com a conjuntura de um personagem em poder mudar e sofrer os efeitos desta chance. No elenco também estão Maria Luisa Mendonça divertidíssima e Fernando Ceylão como um grande amigo de Zero. Nessa ótica, levamos algumas coisas por toda a vida, no caso, a amizade. Desfrutar dessa experiência afirmada por um roteiro interessante e dinâmico, embora falho em alguns aspectos, nos faz lembrar de que nada que vivemos e do que fazemos é tempo perdido, mas parte de nossa irredutível história, afinal, temos nosso próprio tempo... temos nosso próprio tempo. 

2 comentários:

  1. Tenho muita curiosidade em conferir, parece ser uma produção nacional diferenciada muito interessante.

    http://cinelupinha.blogspot.com/

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  2. Muito bom o texto, até me motivou a vê-lo no cinema!

    Valeu até mais!

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