A estreia do curta-metragista Fernando
Coimbra em longas é marcada pela sutileza na condução da trama e na habilidade
em sair do drama policial para o suspense de ocasião, ascendendo a medida que
fatos são revelados. É notório seu comprometimento em extirpar o romantismo
capenga e converter o rumo delgado de produções semelhantes, assumindo uma
direção contrária as pretensões brandas. Aqui o desenrolar é outro, choca pela
pureza e crueza, não tão distante do que já estamos habituados a ver
diariamente em programas sensacionalistas ou jornais, mas distinto graças à
inventividade e coragem de não ser politicamente correto e querer agradar todo
mundo com a fantasia da segurança.
A história gira em torno de um
provável sequestro. A filha do casal (Milhem Cortaz e Fabíula Nascimento)
desaparece, abrindo margens para uma rede de indagações a respeito do
responsável pelo sumiço. A coordenadora da creche onde a menina foi vista pela
última vez diz que a pequena fora embora junto a uma mulher. Pareciam
amigáveis. Segundo as descrições, as suspeitas caem sobre Rosa (Leandra Leal), jovem
que tem um estreito e estanho envolvimento com o casal. Acompanhamos o
desenvolvimento da história através de flashbacks expositivos que possuem
eficiente função narrativa, não só para explicar a ocorrência, mas para
exprimir o suspense, pondo em dúvida a realidade e consequente salubridade dos
discursos.
Sem querer fazer um estudo de
personagem, o roteiro não se atém a alguém especificamente, o que não quer
dizer que nossa curiosidade não seja incitada em compreender as verdades por
trás de cada ato específico, bem como de quem os realiza. Acompanhamos a
investigação e temos total acesso aos depoimentos, e como esses são tirados dos
suspeitos, geralmente originados pelo tom irônico do delegado vivido por Juliano
Cazarré. Esse é o momento de descontração, o alívio que permite algumas risadas
diante o clima hostil envolvente. A personagem de Leandra Leal é a mais
complexa, surpreendendo a todo instante com uma doçura branda e segurança
perspicaz. Acompanhar suas obscuras decisões é a melhor oferta da obra, já que
esta se desenvolve através de pontos de vista. O de Rosa fica reservado para o
derradeiro e impressionante desenlace.
Fernando Coimbra traz na bagagem
a experiência que os curtas lhe ofereceram através dos anos e detalha um
suspense competente com uma técnica que o tempo lhe deu, aperfeiçoada nas
produções particulares onde fazia o que queria. Planos sequências se delongam
em distintos momentos corroborando com o desempenho dos atores que agem
naturalmente. Coimbra tem controle sobre o elenco e sobre o que deseja
apresentar ao público, agindo sem receios quanto às prováveis críticas que
receberia por ser inclemente. Os diálogos são bons e fortalecem nossa dúvida. O
diretor é mais um bom nome que surge em nosso cinema.
São vários os assuntos tratados
no decorrer do filme, entre eles casos extraconjugais e investigação policial,
e nenhuma subtrama tem mais atenção do que deve ter. A narrativa segue um curso
de esclarecimentos enquanto efervesce com cenas picantes de paixões repentinas,
sempre com a interrogação do futuro e dos que os envolve, bem como suas
motivações. Temos a real impressão do quão lúgubre são as relações dispostas em
cena, isso é condizente a fotografia escurecida deixando a noção de omissões, e
aos vários momentos em que grades sobrepõem os personagens, mantendo-os simbolicamente
presos, quase que intimamente inacessíveis.
Sonhos se fundamentam na expectativa, a do outro nos é incerta. E nem
todas as verdades são fáceis de encarar. E nem todas as atitudes são simples de
compreender.
Filme visto no Paulínia Film
Festival 2013
Nenhum comentário:
Postar um comentário