O Tempo e o Vento é a obra prima
de Érico Veríssimo. Também é uma das mais célebres obras literárias brasileiras.
Quando foi anunciada uma adaptação, não faltaram reprovações sobre a possibilidade
de transformar tamanha história num filme. Uma série seria insuficiente para se
ter ideia da dimensão. Os produtores não se importaram e assumiram a responsabilidade,
concebendo um filme que tem lá seus 120 minutos. Pouco, muito pouco. Mas é deveras
corajoso! Quem o assumiu foi Jayme Monjardim, o cara que filmou o enfadonho Olga (idem, 2004) e a linda telenovela A Casa das Sete Mulheres, escrita por Letícia
Wierzchowski. Wierzchowski, aliás, refaz parceria e roteiriza essa adaptação. O
resultado final foi um filme visualmente encantador com uma narrativa apressada,
recheada de passagens da obra original, mas precipitadas, encaixadas em míseros
minutos diante o que sua magnitude essencialmente clama.
Há tanta beleza nessas passagens
fotografadas. Os pampas são exuberantes e a fotografia do competente Affonso
Beato dá todo o aspecto do que foram aqueles tempos, com o sol mergulhando no
solo, referenciando o tempo que o vento levou embora através de distintas
gerações. Assistiremos muitas paisagens em sequenciais planos abertos. Delinear
a história de “O Continente”, o primeiro livro da trilogia “O Tempo e o Vento”,
é um desafio para qualquer realizador. Algo que talvez não devesse ser feito. No
entanto o que o filme de Monjardim proporciona é uma imersão histórica através
do atrativo visual, já que a narração se aproxima muito mais de um episódio
televisivo do que de cinema. Vale principalmente pela curiosidade daqueles que
desconheciam a obra e desejaram definitivamente conhecê-la. Que ao menos
funcione como um estímulo para isso.
Temos acesso a história através
da personagem Bibiana Terra (Fernanda Montenegro) que narra com ternura ao seu
amor, um certo capitão Rodrigo (Thiago Lacerda) representado enquanto figura espiritual,
a trajetória de sua família. Teremos acesso a várias gerações, todas envolvidas
com a guerra, culminando no romance central de Rodrigo e Bibiana (na fase jovial é vivida por
Marjorie Estiano). Tanto sangue fora derramado nos campos
esverdeados e tantos romances condenados. Uma das personagens diz que a
maldição das mulheres da família Terra é ter que esperar, ciente de que às
vezes algumas esperas se eternizarão. Tudo isso aparece sem fundura. Podemos
supor que tudo que Bibiana diz são lapsos desconjuntados do passado sem a
profundidade merecida. O longa é envolvido por bons
artifícios técnicos e artísticos a fim de emplacar a história no gosto popular: a trilha sonora está
exaltada e os figurinos caprichados. Fade in/out dão impressão de episódios, planos
sequenciais favorecem o teor cinematográfico e elipses exprimem a passagem do
tempo, mas surgem expositivas em demasia. A narração é convencional a uma trama
novelesca a qual Monjardim parece não conseguir abandonar.
Os atores se esforçam, buscam dar
importância aos seus papéis. Percebemos que todos são fundamentais e com muito
a oferecer, mas não demoram para seus personagens serem descartados, o que
causa um inevitável desconforto naqueles que acompanham e se interessam especificamente por um ou outro. O tempo não consta no
título arbitrariamente. Ele é fundamental para a história e deve se fazer
presente na narrativa como um diferencial. No filme ele surge como poesia, já
que falta todo o aprofundamento contextual e de personagens que o livro propõe.
Evidentemente comparações entre a obra literária e a cinematográfica são
injustas, mas nesse caso tratamos de algo que nasceu para se imortalizar na literatura. O filme
passará perdurando somente na lembrança da beleza aquecida harmonizada por
romances e guerras febris. Já o livro é um retrato documental de uma das várias
histórias do Brasil com todas as graças reunidas para se perpetuar.
Ótimo texto, realmente despertou minha curiosidade para conhecer mais essa obra...
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