O diretor e roteirista argentino Andres
Muschietti chega a direção de um longa após dois curtas. Entre eles está um
intitulado “Mamá”, lançado em 2008. Já este longa metragem “Mama” é um filme de
gênero, de terror, e traz incontáveis características para contextualizar a
trama revigorando-a com aspectos horripilantes. Duas crianças estão envolvidas. Um espírito também. O início faz jus a expectativa criada diante o
que se espera de um filme de horror: um homem sai em disparada por estradas
cobertas pela nevasca. No banco de traz, duas crianças, duas meninas, temerosas
com a ira do pai dirigindo descontroladamente e a toda velocidade. A tensão
dissemina quando percebemos o carro derrapar até finalmente cair de um
barranco. Nada grave, a não ser o desaparecimento posterior da família na
floresta horas depois quando uma entidade obscura os surpreendeu numa cabana. Mortos ficaram para trás. 5
anos se passaram. As meninas foram encontradas.
Notamos nos créditos o nome de Guillermo
del Toro como produtor. Grandes motivos para nos empolgarmos, já que é um dos
cineastas mais criativos em atividade – este é responsável por maravilhas como “A
espinha do Diabo” e “O Labirinto do Fauno”. Influente, conseguiu levar o
diretor argentino para Hollywood. O filme vai se desenvolvendo e percebemos que
nem tudo é tão atrativo, já que nos deparamos com cenas as quais conseguimos
antecipar o que acontecerá: o gênero está gasto, infelizmente. Todavia há
algumas outras que felizmente surpreendem, melhorando ainda mais no ato final. Para
chegar até lá, um misto de bons e péssimos momentos. Um clima sombrio modela a
narrativa, sombras se acumulam, a fotografia turva e os efeitos sonoros pontuais
favorecem alguns sobressaltos. A estrutura fabulista, embora clichê, é bem executada.
O que compromete a qualidade da empreitada é o prolongamento da história, trata-se
de um curta estendido. Os acréscimos são visivelmente desculpas para tapar
buracos do roteiro. Aí percebemos a quebra de ritmo e constantes incoerências
narrativas.
As meninas, Victoria (Megan
Charpentier) e Lilly (Isabelle Nélisse), ficaram meia década desaparecidas numa
imensa floresta. O desenvolvimento social e físico foram comprometidos, já que
sem laços, cresceram sem modelos, se virando como podiam numa cabana perdida. A
readaptação a sociedade é alvo de estudos por um médico numa clínica psicológica. Essa elaboração é o grande trunfo do
roteiro, trabalhar com essa perspectiva de crianças que cresceram distanciadas
com poucas preservações sociais. Chegamos a um ponto chave: as relações
e o desamparo. Se assemelha a lógica de “O Enigma de Kaspar Hauser”, porém se
aproximam da personagem vivida por Jodie Foster em “Nell”. As meninas cresceram
com uma referência distinta, o espírito que chamam de Mama. O respeito das crianças para
com a entidade fantástica garante singularidade a obra e maior interesse por
parte dos espectadores. Estamos diante um terror sem bem ou mal, a não ser por
definição. Ao final, talvez boa parte do público questione, mas é inegável a
beleza e representação do ato. E há muito a se pensar a respeito deste.
Ainda nesse âmbito psicológico, Andres
Muschietti é inteligente ao demonstrar a contemplação de uma figura reconhecida
como a de um patriarca, já que o protagonista Lucas (Nikolaj Coster-Waldau, de “Game
of Thrones”) é irmão gêmeo do pai das meninas que desapareceu na floresta.
Quando Victoria o vê, após tanto tempo sem vislumbrar uma figura humana a não
ser a de sua irmã mais nova, logo o chama de pai. Ele até procura se explicar. De
outro lado, a namorada de Lucas, a baixista Annabel (Jessica Chastain, ótima)
se mostra resistente com a chegada das pequenas estranhas. Com o passar do
tempo, o laço desenvolvido com as meninas – numa mistura de afeição e rejeição –
torna a dinâmica interessante, quase se convertendo num drama. Os esforços dos
atores contribui para nossa identificação com a sucessão de eventos e, de
alguma maneira, constatar que o que rola em cena é um curioso duelo de mamas.
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