quarta-feira, 13 de julho de 2011

Proseando sobre... O Palhaço



O novo trabalho de Selton Mello traz o ator num solo conhecido, despojado, assemelhando-se ao tom humorístico costumeiro de seus personagens. Porém aqui está com maior intensidade e irreverência assumindo o papel de um palhaço, refletindo em cena alegria e solidão. É mais do que fundamental entreter, é preciso argumentar, refletir, provocar. Selton Mello não só atua, ele escreve, dirige e produz – é seu segundo trabalho como diretor. O primeiro foi o bom “Feliz Natal” de 2008. Esta nova obra, intitulada “O Palhaço” fala da vida, dos sonhos, das ambições e das possibilidades. Como palhaços, frente ao público, o longa têm como um dos grandes objetivos fazer sorrir. E consegue.

O sorriso pintado no rosto não reflete o que se passa dentro do artista. Assim, com certa melancolia, esse tragicômico trabalho avança por terrenos adversos ao anunciado bom humor de seu início, e outros rumos são explorados quando percebemos a dura realidade da vida dos artistas de um circo itinerante chamado “Esperança” – não poderia ter um nome mais apropriado. Atravessando cidades sobre carros e caminhões velhos, o circo liderado pelo palhaço Puro Sangue (Paulo José) nunca sabe o que vai encontrar pela frente. Em seus bastidores, especulações quanto a possibilidade do sucesso da noite são dadas, centrando sobretudo nos prefeitos das cidades. As piadas referentes a eles remetem a idéia da necessidade em ser aceito nos vários locais em que passam.

Puro Sangue é o codinome de Valdemar, pai de Benjamim (Selton Mello), que nas noites de espetáculo assume a identidade do palhaço Pangaré. O roteiro do longa propõe um atravessamento do riso ao choro, explicitando em diálogos e observações, o que se tem feito da vida naquela transitividade sem grandes laços. Benjamim, por exemplo, não carrega mais do que uma certidão de nascimento e é quase uma figura inexistente dentro da sociedade, rodando o Brasil sem identidade e ressentindo-se pela crença da ilusão de seus feitos, almejando diariamente fugas.  

Ao conceber a idéia de “O Palhaço”, Selton Mello se inspirou na própria vida, numa fase desacreditada de sua carreira. No cenário de luzes brilhantes, atrás do picadeiro resta a tristeza e escuridão. Sem falar na exploração e nos eventuais roubos que acontecem quando racham o dinheiro da arrecadação das apresentações. Mas o espetáculo não pode parar, apesar dos pesares. Benjamim sofre e idealiza outras alternativas em busca do que em sua essência verdadeiramente é. Sua ida atrás de uma garota até Passos na Aldo Auto-peças é referencia a desesperança decorrida. Há ainda o notório trabalho de fotografia de Adrian Teijido abrilhantando a obra. 

Essa busca por respostas do protagonista acarreta também uma relação curiosa com um objeto: um ventilador. É como se ele precisasse do produto como completude de um vazio, seria a solução da falta que sente de coisas a qual é privado. Tal sugestão é dada em um ato por um personagem ao referir-se sobre o calor assolador. Remete, aí, ao apego a algo, a qualquer coisa que faça sentido, sem temer o absurdo que pareça. Bons personagens complementam a obra cujas atuações dignificam. Além de Paulo José e Selton Mello em estado de graça, o elenco ainda conta com Moacyr Franco, Emílio Orciollo Neto, Jackson Antunes, Jorge Loredo e Danton Mello em breves e ótimas aparições.



Claramente inspirado em “Os Trapalhões”, o filme é uma alegoria suave sobre difíceis fases da vida a qual todos estão sujeitos quando se flagram perdidos em seus caminhos. Na arte de representar, alguns se encontram e o brilho do espetáculo, quando aplaudido, restabelece. Com passagens que fazem lembrar de “O Sétimo Selo” do Bergman e “A Estrada da Vida” de Fellini, entre outras referências, como uma cena recordando “Macunaíma”, obra-prima de Mário de Andrade – adaptado para o cinema por Joaquim Pedro de Andrade –, “O Palhaço” é uma adorável menção ao ser humano disposto a tudo para ser feliz mesmo que pareça uma proposta por vezes inatingível – e ser feliz não é uma das coisas que mais ambicionamos? 


3 comentários:

  1. Apesar dele, como pessoa, me irritar um tantinho... Como artista adoro!
    Já estava curiosa por ver este filme.. agora é certeza!

    ;D

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  2. selton mello um dos grandes atores da atualidade sem dúvida

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  3. mais um grande espetáculo deste que ama seu oficio Selton Mello

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